sexta-feira, 1 de outubro de 2010

É veneno!

O outono chegou e, com ele, pendurado às omoplatas, veio também o inescrutável: a recém-chegada à cidade chamada de Marie. No começo Malaquias tentou não se preocupar e não interagir, por receio ou mesmo por ser um rapaz especialmente taciturno; camponês, filho de pais escravos, cinco irmãos e uma irmã, levava uma vida razoavelmente sossegada, quando comparada a outros campesinos trabalhadores que sofriam de letargia e problemas respiratórios. Malaquias, ao contrário de toda população daquele pequeno ladarejo, era um jovem culto, adorava recolher-se no bosque, fugindo dos soldados reais, e deitar-se sobre as laranjeiras, empunhando seu livro até que caísse no sono. No fundo era uma pessoa romântica. Bem no fundo.

E o jovem camponês começou a se interessar por Marie. Interessou-se tanto que a mera admiração virou amor platônico.

Dias após o começo da obsessão, eis que, no vilarejo, é anunciada a chegada de Profane, homem inescrupuloso, convencido, herdeiro do rei Stencil e, como de se esperar, cobiçado por todas jovens do reino tão-tão distante. Veio num cavalo branco, escoltado por soldados da infantaria escocesa, com uma roupa parecida que dourada à ouro, de tão reluzente e chamativa. Moças de todo local e de todos os lugares se reuniram para vê-lo, enquanto Marie pendurava roupas no jardim de sua cabana. O príncipe, de longe, avistou-a, desceu do cavalo e dirigiu-se à ela, fascinado com a beleza da jovem. Qual é seu nome?, perguntava. Nunca vi olhos tão bonitos, dizia e futuramente repetia isso no seu castelo, nos cômodos aconchegantes da nobreza.

Tomado pelo desespero, Malaquias imaginou-se requisitando um duelo pela mão de Marie, mas a vida nobre é melhor para ela, constatava. Na tarde que antecedia o Inverno, exilou-se sobre o alto de uma montanha, pensativo. E do bolso apanhou um pequeno cantil d’água. Observando o horizonte, bebeu do líquido e depois de alguns minutos espirrou como se aspergisse a sua alma, desabando do penhasco como uma pedra apaixonada.

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